Por dentro de quase nada, mas querendo mostrar o que há dentro de mim. Meu nome é Fabiana e às vezes escrevo coisas.

17 maio 2009

Felicidade com Poucos Bens


Embora a experiência me tenha ensinado que se descobrem homens felizes em maior proporção nos desertos, nos mosteiros e no sacrifício do que entre os sedentários dos oásis férteis ou das ilhas ditas afortunadas, nem por isso cometi a asneira de concluir que a qualidade do alimento se opusesse à natureza da felicidade. Acontece simplesmente que, onde os bens são em maior número, oferecem-se aos homens mais possibilidades de se enganarem quanto à natureza das suas alegrias: elas, efectivamente, parecem provir das coisas, quando eles as recebem do sentido que essas coisas assumem em tal império ou em tal morada ou em tal propriedade. Para já, pode acontecer que eles, na abastança, se enganem com maior facilidade e façam circular mais vezes riquezas vãs. Como os homens do deserto ou do mosteiro não possuem nada, sabem muito bem donde lhes vêm as alegrias e é-lhes assim mais fácil salvarem a própria fonte do seu fervor.
(Antoine de Saint-Exupéry, in "Cidadela")

Volta e meia me pego analisando minha vida profissional - se acho que estou bem até aqui, se é isso mesmo que eu queria da vida, ou de que forma posso melhorar e evoluir. Tempo desses, confesso que estava parecendo uma louca, pensando em como ganhar a maior quantidade de dinheiro possível no menor espaço de tempo, a fim de concretizar todos os meus sonhos.

[Pausa dramática] "Sonhos", neste caso = Desejo consumista desenfreado.

Isso estimula dentro do ser humano a busca por uma espécie de "felicidade" que nunca será encontrada, pois o homem é, por sua natureza, um ser insatisfeito. Deus fez nossa alma insaciável por um motivo - buscá-lo intensa e incansavelmente. Mas este propósito se desvia quando nos deparamos com as maravilhosas distrações deste mundo. Carros, jóias, roupas, calçados, viagens, baladas. Poder desfrutar ilimitadamente disso tudo causa dentro de nós uma euforia, uma sensação de alegria e satisfação que só quem experimentou pode confirmar o que digo. De fato preenche a nossa alma - por hora - e nos leva a nos enganar sobre a natureza da verdadeira alegria, como diz o texto de Exupéry.

Recado de Deus através de Salomão, em Provérbios 11:2: "...com os humildes está a sabedoria." Sei que ele quis falar da humildade de coração, e não exatamente da carência de bens materiais, mas estou buscando entender a humildade como um todo. Toda vez que vou em cidades do interior, fico imaginando como aquelas pessoas sobrevivem sem shopping, sem internet, sem carro, muitas vezes sem eletricidade! Viu como minha mente funciona? Já associa alegria e diversão a coisas materiais, quando, o que ocorre na verdade, é que estas pessoas simples aprenderam a se alegrar e a viver com quase nada. Não estabelecem grandes pré-requisitos para que haja alegria. Encontraram alegria no pouco que Deus lhes entregou para administrar.

O fato é que a única coisa que alegra a alma do ser humano de forma completa e definitiva é a presença de Deus, é a alegria de saber que não nascemos por acaso ou por acidente, mas que um ser soberano nos criou com um propósito. Aí sim, nossa insaciabilidade vai se voltar para conhecê-lo e desvendar Sua vontade pras nossas vidas. Faltando todo o resto, mas existindo isso, somos felizes. Existindo todo o resto e faltando Deus, estamos incompletos.

Ademais, um conselho bem antigo:
"Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; Mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração." (Mateus 6:19-21)

04 maio 2009

O mundo inteiro é uma moldura


Caminhava com dificuldade por conta da neve, e afundava suas pernas até quase chegar aos joelhos. Quanto ao frio? Incomodava mais quando parava por alguns instantes procurando desesperadamente por aquele algum sinal.

Olhava para cima e para os lados, para frente e para baixo, para si e para trás. A brancura machucava seus olhos e já nem sabia mais onde estava, mas sabia que estava em algum lugar e, como apostou consigo, em algum lugar havia de encontrar algo que lhe enchesse de vida em meio à paisagem morta.

Sentia-se só e cultivava um desejo crescente de dar cabo a tudo aquilo pelo qual havia passado. A sorte lhe tirara tudo que mais amava e acreditava piamente que em meio à estérie paisagem, encontraria uma finalidade ou o seu fim.

Estava cansada e cambaleante e, antes que pudesse perder os sentidos, perdeu o chão. Tombou lateralmente e desceu aos trombos no barranco que mais parecia planície pela confusão do branco fundindo céu e terra. Aterrissou violentamente revirando uma porção mais fina de neve e revelando um botão de flor amarelo-vivo sem par.

Sem forças para levantar, ficou imóvel. Admirava o botão como se tudo ao redor fosse apenas uma moldura dedicada àquela flor. “O mundo inteiro é uma moldura”, sussurrou suavemente como se soprasse ao próprio ouvido a verdade mais importante que já se deparara.

Inevitavelmente comparou-se ao ser vivo à sua frente. Percebeu que havia semelhanças entre a sobrevivência deste ser em um ambiente hostil e sua vida. Ao elevar sua mente para tais pensamentos, não teve o desprazer de sentir seus músculos enrijecerem e a circulação diminuir pouco a pouco, levando o frio de suas extremidades ao coração que batia fraco.

Como um pequeno iglu, suas mãos cercaram a pequena flor, dando-lhe a proteção da qual nunca foi provida. E assim permaneceu até ser encontrada dias depois.

Ao fim da vida, sentiu-se fraca o bastante para perder o senso de normalidade e entregar-se a morte como uma saída, e por isso foi julgada como louca. Mas em seus instantes finais, ofereceu proteção à vida de uma flor. Qual a dimensão e o valor que damos à vida como um todo? Qual o sentido dessa passagem ou deste fim? Em alguns casos somos medidos pelo que cultivamos, em outros pelo que somos lembrados e até mesmo pelas ações que modificaram nossos pares. Acredito na moldura em que estamos inseridos e como ao final visualizaremos este quadro em que somos a pintura e o pintor, e que ao final, quando nosso quadro for assinado, nossa ultima cena reflita o que fomos quando em branco todos começamos.

Este texto foi presente de um amigo muito querido e, dentro em pouco, distante. Amei mais do que qualquer outro presente. Por isso está aqui.