“Nasce, cresce, reproduz-se, envelhece e morre.” Não sei se continua sendo ensinado desta forma, mas no tempo em que aprendi na disciplina de Ciências este era o ciclo de vida do ser humano. A minha cabeça fantasiosa sempre procurava as exceções: “Ok, ele nasce. Mas e se não cresce e fica anão? E se não quiser ter filhos? E se morrer antes de envelhecer?” Aquela sequência sempre foi meio furada para mim.
Interessante como a tendência aos ciclos óbvios nos persegue durante toda a vida. A disposição que todo mundo tem em seguir determinada ordem dos fatores para se enquadrar, para ser aceito, para ser feliz. Lembro-me bem que demorei um pouco a tirar carteira de motorista; a princípio porque eu não ligava pra isso. Depois, todos na faculdade, antes mesmo de entrarem ali, já dirigiam. Era a “ordem das coisas”: terminar o ensino médio, tirar carteira, entrar na faculdade dirigindo. Eu estava atrasada. Ou invertendo a sequência. Uma amiga largou os estudos para ir a uma escola de missões. Quase um escândalo na família, pois o passo seguinte ao vestibular, era levar o curso até o fim, e não suspendê-lo para fazer o que quer que fosse. Ouvi que alguém tinha uma ótima proposta de emprego, ou que ia casar, mas optou por viajar para a África e fazer trabalho humanitário. Fulano largou tudo e foi ser músico. Beltrana descobriu que seu maior prazer está na vocação religiosa – deixou de ser advogada e foi ser freira.
Estes são exemplos de pessoas que não seguiram o óbvio da vida. Deixaram seu coração, suas vocações, a voz de Deus falarem mais alto do que todas as outras vozes ao seu redor. Quebraram barreiras em si mesmas, romperam paradigmas nos outros, foram exceções à regra.
Pode-se dizer que o Evangelho hoje está por aí – nos livros, nas igrejas, na mídia, em folhetos, na boca de evangelistas ou em conversas num bar. Deixar Jesus Cristo fazer parte de nossas vidas é um grande passo a ser dado. No entanto, neste contexto, ainda me incomoda viver uma vida como “todo mundo”, seguindo a velha “ordem das coisas”, de ser a mesma pessoa de sempre, com a diferença de que irei à igreja aos domingos. Acredito num Espírito Santo expansivo – que mora dentro de nós, que alarga nossos horizontes e nos instiga a viver mais do que essa regra do “todo mundo”. Creio num Deus que, mesmo no meio de nossa rotina corrida, é capaz de nos mostrar espaços onde podemos deixar seu Espírito Santo agir através de nós, invertendo a ordem, saindo do óbvio, tocando vidas, fazendo algo em prol do próximo ou, quem sabe, da humanidade ou do planeta. Acredito num Pai carinhoso que, com todo amor nos questiona: “E aí, filhinho(a)? Como posso HOJE fazer a diferença neste mundo através de sua vida?” Qual a nossa resposta para este chamado? Seria um SIM, mesmo que isto implique fugir à regra?
Texto publicado em 19/08/2010 no blog Cotidiano e Fé, no Jornal O Povo.